Um fundamento de 152 anos

No último dia 12 nós presbiterianos comemoramos os 152 anos da chegada de Simonton. Vindo dos Estados Unidos e aportando no Rio de Janeiro, esse missionário deixou um legado que se espalhou por todo o país e já dura todo esse tempo. Fomos a primeira denominação a se estabelecer no Brasil e nossa história monstra, além de Ashbel Green Simonton, muitos outros missionários que demonstraram seu valor ao lutarem pela pregação do evangelho.

Como exemplo desses homens abnegados até a morte, podemos citar José Manoel da Conceição. Este homem foi o primeiro pastor brasileiro ordenado. Ex padre, teve um ministério itinerante e pregou o evangelho contando com o abrigo dado por aqueles que aceitavam seu trabalho como pagamento. Morreu sozinho no Rio de Janeiro, numa noite de natal, sem glórias, agradecimentos ou honras.

Poderia citar outras personagens dessa história, homens e mulheres que não procuraram honra própria, mas o espírito visto em José Manoel da Conceição é suficiente para entendermos um legado digno é fundamentado no amor abnegado pelo evangelho, não pela honra pessoal.

Um texto bíblico me vem à mente nessa hora:

Nada façais por partidarismo ou vanglória, mas por humildade, considerando cada um os outros superiores a si mesmo. Não tenha cada um em vista o que é propriamente seu, senão também cada qual o que é dos outros. Tende em vós o mesmo sentimento que houve também em Cristo Jesus, pois ele, subsistindo em forma de Deus, não julgou como usurpação o ser igual a Deus; antes, a si mesmo se esvaziou, assumindo a forma de servo, tornando-se em semelhança de homens; e, reconhecido em figura humana, a si mesmo se humilhou, tornando-se obediente até à morte e morte de cruz.” (Fl 2.3-8)

Ao contrário do que muitos fazem em seus ministérios, JMC, Simonton e outros evangelistas de tantas outras denominações históricas, desejaram ver a glória de Deus através das conversões, não do sucesso financeiro de suas igrejas. Sucesso para esses crentes não se referia à quantas multidões eram atraídas aos seus cultos, mas a quantos eles conseguiam apresentar o evangelho. Infelizmente, os tempos mudaram e o foco de muitos obreiros que não se parecem em nada – e, pelo visto, não querem nada – com o ministério desses homens, que se assemelhava ao de Paulo.

Em 2 Coríntios 11 vemos Paulo defendendo sua autoridade apostólica. Interessantemente, ele o faz contra pessoas que se diziam apóstolos e que, pelo o que o texto indica, esses homens se valiam de muita pompa e ousadia, ao ponto até de esbofetear os membros da igreja. A igreja, aparentemente, se deixava levar por tudo isso e dava mais ouvidos a estes cheios de honras pessoais, que ao apóstolo Paulo em sua simplicidade e espírito de servidão.

Quisera eu me suportásseis um pouco mais na minha loucura. Suportai-me, pois. Porque zelo por vós com zelo de Deus; visto que vos tenho preparado para vos apresentar como virgem pura a um só esposo, que é Cristo. Mas receio que, assim como a serpente enganou a Eva com a sua astúcia, assim também seja corrompida a vossa mente e se aparte da simplicidade e pureza devidas a Cristo. Se, na verdade, vindo alguém, prega outro Jesus que não temos pregado, ou se aceitais espírito diferente que não tendes recebido, ou evangelho diferente que não tendes abraçado, a esse, de boa mente, o tolerais. Porque suponho em nada ter sido inferior a esses tais apóstolos. E, embora seja falto no falar, não o sou no conhecimento; mas, em tudo e por todos os modos, vos temos feito conhecer isto. Cometi eu, porventura, algum pecado pelo fato de viver humildemente, para que fôsseis vós exaltados, visto que gratuitamente vos anunciei o evangelho de Deus? Despojei outras igrejas, recebendo salário, para vos poder servir, e, estando entre vós, ao passar privações, não me fiz pesado a ninguém; pois os irmãos, quando vieram da Macedônia, supriram o que me faltava; e, em tudo, me guardei e me guardarei de vos ser pesado. A verdade de Cristo está em mim; por isso, não me será tirada esta glória nas regiões da Acaia. Por que razão? É porque não vos amo? Deus o sabe. Mas o que faço e farei é para cortar ocasião àqueles que a buscam com o intuito de serem considerados iguais a nós, naquilo em que se gloriam. Porque os tais são falsos apóstolos, obreiros fraudulentos, transformando-se em apóstolos de Cristo. E não é de admirar, porque o próprio Satanás se transforma em anjo de luz. Não é muito, pois, que os seus próprios ministros se transformem em ministros de justiça; e o fim deles será conforme as suas obras. Outra vez digo: ninguém me considere insensato; todavia, se o pensais, recebei-me como insensato, para que também me glorie um pouco. O que falo, não o falo segundo o Senhor, e sim como por loucura, nesta confiança de gloriar-me. E, posto que muitos se gloriam segundo a carne, também eu me gloriarei. Porque, sendo vós sensatos, de boa mente tolerais os insensatos. Tolerais quem vos escravize, quem vos devore, quem vos detenha, quem se exalte, quem vos esbofeteie no rosto. Ingloriamente o confesso, como se fôramos fracos. Mas, naquilo em que qualquer tem ousadia (com insensatez o afirmo), também eu a tenho. São hebreus? Também eu. São israelitas? Também eu. São da descendência de Abraão? Também eu. São ministros de Cristo? (Falo como fora de mim.) Eu ainda mais: em trabalhos, muito mais; muito mais em prisões; em açoites, sem medida; em perigos de morte, muitas vezes. Cinco vezes recebi dos judeus uma quarentena de açoites menos um; fui três vezes fustigado com varas; uma vez, apedrejado; em naufrágio, três vezes; uma noite e um dia passei na voragem do mar; em jornadas, muitas vezes; em perigos de rios, em perigos de salteadores, em perigos entre patrícios, em perigos entre gentios, em perigos na cidade, em perigos no deserto, em perigos no mar, em perigos entre falsos irmãos; em trabalhos e fadigas, em vigílias, muitas vezes; em fome e sede, em jejuns, muitas vezes; em frio e nudez. Além das coisas exteriores, há o que pesa sobre mim diariamente, a preocupação com todas as igrejas. Quem enfraquece, que também eu não enfraqueça? Quem se escandaliza, que eu não me inflame? Se tenho de gloriar-me, gloriar-me-ei no que diz respeito à minha fraqueza.” (2Co 11.1-30)

O texto é longo mas diz tanto sobre a simplicidade e o sofrimento de Paulo em seu ministério, que é melhor que qualquer palavra minha para comparar com o que é feito pelos apóstolos pós-modernos. Estes não gostam de lutas, dificuldades, ou sofrer por causa do evangelho. Perceba pela descrição de Paulo, que os apóstolos atuais se parecem mais com os falsos apóstolos daquele tempo, que com um apóstolo verdadeiro como Paulo. Longe de sofrer por Cristo, Rene Terra Nova, Valdomiro Santiago, Estavam Hernandes e outros, gostam da honra, do sucesso, carros importados, ganhos astronômicos e afins. Mas o pior é que a falta de um fundamento histórico de homens dedicados ao evangelho – às vezes por opção – tem feito com que crentes aceitem submeter-se à magnatas do evangelicalismo, que dominam, impressionam com pompa, gostam de capas, shows da fé e de dominar a fé de seus seguidores.

Como fruto de um trabalho que dura 152 anos, só tenho o que agradecer a Deus. Entre acertos e erros, a fidelidade à Palavra e o amor ao próximo e a Deus, acima de tudo, tem demonstrado que o evangelho tem muito mais a ver com a simplicidade do fazedor de tendas que não queria ser pesado à igreja do que com a pompa daqueles que guiam suas igrejas ao sabor das finanças. Por outro lado, vemos ditos pastores, bispos e apóstolos darem de ombros à simplicidade e criarem teologias de honra e sucesso, que os favorecem de modo criminoso e diabólico. Mas, infelizmente, nem os avisos de Jesus de que nem todos que dizem ter profetizado e expulsado demônios em seu nome de fato são seus (Mt 7.22,23), tem sido suficiente para acautelar os crentes desses mercadejandores do evangelho.

Vemos cenas grotescas de pessoas jogando dinheiro aos pés de seus líderes (veja o vídeo) e desculpas esfarrapadas para justificarem tais atitudes. Vemos comportamentos que beiram a demência com o rótulo de espiritualidade. Como pastor de uma igreja histórica, tenho visto um movimento em direção à igrejas que buscam mais o Espírito da Palavra (via de regra as históricas) que esse espírito estranho que faz com que pessoas engatinhem imitando leão, rodopiem como um pião ou dancem como se estivesse num roda de umbanda.

A IPB pode ser a mais antiga denominação do Brasil, mas temos outras denominações históricas que podem acompanhar a IPB, a fim de demonstrar que a glória de Deus se vale de seu poder em transformar um pecador num servo, e não pecadores em figurões gospel.

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