Oração, um exercício diante de Deus

Como um calvinista tenho grande interesse na oração. Ao contrário do que muitos podem pensar, Calvino não foi um aficionado pela predestinação. Na verdade, ele escreveu muito mais sobre a oração do que a predestinação em sua obra magna, As Institutas. Assim como ele, valorizo esse meio de exercitar a fé, que o Senhor nos deu.

Minha compreensão, no entanto, desta matéria obviamente leva em consideração a predestinação, bem como uma série de outras doutrinas. Contudo, não é meu objetivo fazer ou ficar evidenciando esta ligação com cada uma das doutrinas que levo em consideração, na hora de pensar em oração. Meu ponto aqui é vermos o ensino bíblico sobre a oração.

Para iniciarmos, poderíamos tomar o ensino do Senhor no sermão do monte. Outro caminho seria partir do AT, mas penso que com a vinda de Cristo alguns aspectos mudaram, ou foram revelados, de modo que, prefiro partir do ensino de nosso redentor.

Em Mateus 6 vemos a parte do sermão do monte, na qual Cristo aborda a questão da oração. A partir do verso 5, após falar do modo correto de se dar esmolas, Jesus passa a falar do modo correto de se orar. É interessante esse contexto, pois o assunto é a justiça própria, não a oração em si, mas o Redentor nos mostra de que modo a justiça própria pode nos afetar em nossa oração.

Se temos o desejo de sermos visto, não é com o Senhor que queremos nos comunicar quando oramos. É a partir desta ideia que Jesus partiu. Portanto, oração, antes de tudo, é algo feito para Deus. Por mais óbvia que essa afirmação possa ser, o perigo de deixarmos seu ensino de lado a torna sempre pertinente. A preocupação com o que os outro irão pensar, ou pior, de querer se mostrar como uma pessoa de oração para os outros, anula nossa comunicação com Pai.

Desde o AT, vemos que Deus é um ser bem ciumento. Nos seres humanos esse sentimento de posse seria pecaminoso, mas no Criador é justo. Verdadeiramente, tudo lhe pertence, portanto, ele está correto em querer tudo para si. Em nossa oração isso não é diferente. Seu desejo é que entendamos que ele é o todo-poderoso e, por isso, merecedor de toda a nossa atenção. Isso significa que, se estamos preocupados em parecer ou não parecer algo diante dos outros, então, não entendemos que orar significa que estamos falando com o ser mais poderoso e importante que existe.

É por esse motivo que fechamos os olhos. A concentração se torna algo central quando oramos. Não porque podemos errar em alguma palavra, mas porque não estaríamos priorizando a Deus. A solução para essa tentação de ser orar a fim de convencer alguém de alguma coisa foi dada por Cristo. De modo muito simples ele disse para que entrássemos em nossos quartos e ali, em secreto, longe da possibilidade de deixarmos que nossa justiça própria prevalecesse sobre nossa comunhão com Deus, orássemos. Mas o conhecimento de Deus deveria nos levar a outra verdade sobre a oração.

Sabendo que estamos diante de um Deus onisciente, não podemos pensar que são nossas palavras que o guiam. Diferentemente do que muitos podem pensar, não são nossas orações que movem a Deus. Ele nem precisa que oremos para saber do que precisamos. Orar repetidamente, com as mesmas palavras é crer que são nossas palavras que trazem o efeito, não o Deus a quem oramos. Por isso, mais uma vez, saber com quem estamos falando, nos conduz à prática correta da oração.

A comparação que o Senhor fez é significativa. Ele compara aqueles que repetem as orações com os gentios. Longe de querer dizer que não havia qualquer tipo de esperança aos não judeus, Jesus os estava citando pelo fato de não serem o povo que conhece a Deus. Os judeus deveriam saber quem é Iavé, o que tornaria inaceitável qualquer tipo de repetição, que desconsiderasse a onisciência e a soberania divina. Isso significa que a confiança depositadas em um determinado arranjo de palavras é fruto de um entendimento errôneo tanto da oração, quanto do ser de Deus.
Diante disso, temos de ter cuidado com nossas palavras. Não pense que bater o pé, dando palavras de ordem; repetir diversas vezes “eu determino”, “exijo”, “em nome de Jesus” e tantos outros jargões do oratório evangélico, vai mudar o poder, ou os resultados de sua oração. Interessantemente, a maioria dos evangélicos criticam os católicos por rezarem sempre as mesmas palavras, contudo, o uso excessivo de algumas dessas expressões nos leva a crer que evangélicos também padecem do mesmo mal.

Mais uma vez, vemos o estrago da justiça própria. Pensamos que nossa garantia está em nossas palavras, não no Senhor. Neste momento, acho interessante lembrarmos das palavras de Paulo, em Romanos 8.26: “Também o Espírito, semelhantemente, nos assiste em nossa fraqueza; porque não sabemos orar como convém, mas o mesmo Espírito intercede por nós sobremaneira, com gemidos inexprimíveis.” Perceba que o apóstolo disse que nem sabemos orar como convém; é o Espírito que intercede por nós, de modo que nem mesmo o vemos, pois é por meio de gemidos inexprimíveis que ele o faz.

O fato é que não sabemos orar. Confiar que são nossas palavras, dispostas de modo correto em nossas orações que garantem o resultado, ou que as tornam aceitáveis é ignorar a verdade sobre os efeitos do pecado em nossa vida. Além disso, é tirar o foco da maravilhosa graça de Deus em nos providenciar seu Espírito, para nos substituir nesta debilidade.

Meus caros, orem! Orem, sem esquecer quem está ouvindo. Sem esquecer quem você é. Sem esquecer quem de fato está agradando a Deus.

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